quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Juquiá relatos do anuário de Stokler.

1832 – O Quilombo do Guyromby.

Mesmo diante do registro de biografias de antigos moradores do Juquiá ou de variados documentos escritos, não se sabe quando a realidade dos acontecimentos se envolve com as lendas ou com o folclore. Os relatos populares, passados de “boca em boca”, geração após geração, na maioria das vezes podem ser distorcidos ou suplantadas pela emoção do narrador. Outras vezes, os relatos seguem incólumes pelo tempo e são leais à realidade dos fatos acontecidos.

O “Annuário de Stokler” faz menção de um núcleo de negros foragidos que existia no Rio Guyromby, afluente do Juquiá. É interessante observar que, quando se fez o registro deste núcleo, o dito rio ainda mantinha dois nomes: Rio Guyromby (Guaromby) ou Quilombo. Segundo Stokler, essa tendência se caracterizou diante dos relatos de Martim, o segundo protetor dos índios cayuás, aldeados no Itariri, que, por sua vez, contaram a ele de um combate que se deu no Guyromby, onde todos os negros foragidos foram exterminados impiedosamente.

“Chegou em nossa caza o senhor Martim dos índios que mui é bom armeiro e conhecedor de armas todas e que delle precizavasse para dar utillidade em alguas que aqui se encontravão estragadas pello uzo. O Martim é mui conhecedor dos índios do Tariry e bom amigo delles e contou alguas cousas vividas pello povo do Tariry e que por essa épocha estão querendo destratar os do Juquiá. Contou elle que antes da épocha de Gusmão, amigo seo e dos índios, mui antes de occupar as gentes no entornos do Juquiá (1750) e asima, negros fogidos do Iguape e doutras regiões reunirãosse no Guyromby adentro para nelle habictar e formarão hua colônia delles que distava das cidades e occulta ficava de todos. Os fogidos que alli moravão erão em maes de quarenta delles e usavão o Guyromby na luz do dia e no Juquiá andavão com suas cannoas despos da noite chegada. Hum negro fogido andou de cannoa na prohibida luz do dia no Juquiá e foi elle surprehendido por outra cannoa com os índios do Tariry”. Stokler – 1832.

“O cativo fez frencte de tiro aos do Tariry para que elles fossem expulsos daquelle logar e não soubessem elles da povoação de fogidos no Guyromby. Os do Tariry não collocarão resistência e subirão o Juquiá com o negro fogido adentrando no Guyromby e deixando os do Tariry lhe perceber donde se hia elle. Alguns dias despos descerão os do Tariry com numero grande de cannoas e adentrarão o Guyromby e surprehenderão os cativos fogidos nas suas cazas e lhe derão matança de todos elles daquelle logar. Pouccos delles conseguirão dalli fogir para o mato e dous delles pedirão socorros ao velho Gusmão que apazigou a todos e fez delles irem para outro logar tempos despos. Ficou o Guyromby de nome dado pelos índios antigos com o uzo de outro nome que é do Quilombo, donde moravão os negros fogidos”. Stokler – 1832.

1835 - Os Índios Atacam o Povoado

Quando Cabral chegou ao Brasil, aqui existiam mais de quatro milhões de índios. Os colonizadores que se instalaram nas novas terras eram constituídos de degradados, desterrados e náufragos, iniciaram, desde 1500, uma matança indescritível, perseguindo todas as tribos que habitavam inicialmente o litoral. Cem anos depois, com os bandeirantes desbravando o interior dos sertões, em busca do ouro e pedras preciosas, milhares de índios foram feitos prisioneiros e levados para as plantações de cana de açúcar. No mercado brasileiro o índio não valia muito: trocava-se dois índios por um cativo negro e vinte deles por uma boa mula.

A maioria dos indígenas não aceitou esta situação constrangedora e os suicídios eram constantes. Sabedores da necessidade de se defenderem em grupos fortes, os índios se uniram aos franceses quando da invasão do Rio de Janeiro e aos holandeses quando estes tomaram Pernambuco. Enfim, traídos por portugueses, franceses e holandeses passaram a atacar quem lhes cruzasse o caminho. A raiva e a fúria com que tratavam o homem branco, que os desalojava de suas terras, tinha muita razão de ser.

No Vale do Rio Juquiá, nos primórdios do descobrimento, aconteceram os mesmos horrores causados aos demais índios do Brasil. Além da escravatura, a frenética busca do ouro nestas terras também colaborou para a dizimação da raça indígena que ainda existia no lugar e que era formada pela tribo cayná ou cayuá, do tronco tupi-guarani, que antes habitava em quase toda a costa do litoral paulista.


Índio Cayuá, em 1908.

Diante de tanta perseguição às suas tribos e destruição de seu habitat, por parte do europeu, era natural que os índios se revoltassem, mais uma vez, e tentassem destruir o opressor invasor de suas terras. Com a criação da Freguesia de Santo Antonio do Juquiá, levas de famílias começaram a se instalar na região, unindo-se aos “invasores” já existentes, que passaram a derrubar as matas dos índios e transitavam constantemente pelos rios, fazendo com que eles, os verdadeiros donos do lugar, passassem a se esconder e a construir suas aldeias o mais longe possível, sempre de maneira provisória, tornando-os mais nômades do que realmente o eram. Não demorou muito tempo e os nativos decidiram colocar um fim à evolução dos estrangeiros usurpadores.

“Estavão os França e João Filgueiras nhu’a caçada nas matas do São Lourenço quando forão surprehendidos pelo gentio selvagem na bera do dicto rio. Os homens não atirarão porque não havião conseguido tempo. Forão elles agarrados e postos no chão e de joelhos muita algazarra sefez sobre as suas cabeças. Pensarão elles morrer e encomendarãosse as suas almas a protecção de Deus. Os índios afundarão a cannoa e lhes fizerão correr de pontada de pao e baterão nas suas
costas e cabeças. Chegarão elles no Juquiá varando com difficuldade o mato alto. Disseme o Martim que não maes pode controllar os seos amigos índios que estão revoltados com as gentes do Juquiá por lhe invadirem as terras e de poucco caso fazerem delles”. Stokler – 1833.

Noutra feita, em fevereiro de 1834, no ribeirão do Poço Grande, os irmãos Pereira e Lourenço Fernandes (a quem imaginamos ser o avô de Felipe Fernandes e pai de Fernando Gomes, que foi o primeiro Juiz de Paz de Juquiá), caçavam e colhiam sementes de café em antigas árvores cafeeiras, que deviam estar ali plantadas há muito tempo, quando os índios os surpreenderam e os puseram para correr rio abaixo.

“Despos de matar dous caititus e com elles voltar a sua caza, os irmãos da família Pereira e o Lourenço Fernandes, velho que dizem avô de Felipe Fernandes e pae de Fernando Gomes, forão subindo o Juquiá e despos o São Lourenço até a barra do Tariry na cata de sementes de caffé nos pés de mui annos alli abandonados. Na barra do ribeirão do Poço Grande de Sima tiverão entrevero com os índios que lhe querião fazer matança e selhe fizerão frencte de tiro os sitiantes, estando os do Tariry em três canoas e quaze dez índios. A ninguém dos nossos elles ferirão e com tudo selhe collocarão em correria rio abaixo da barra que despos allertarão o povo do occorrido passado para que ficassem de sobreavizo dos índios que estavão bravios e perigozos”. Stokler – 1834.

Depois de ataques esparsos e isolados, no início de 1835, a 04 de fevereiro, a Freguesia de Santo Antonio do Juquiá foi atacada pelos índios cayuás do Itariri. Embora os moradores e sitiantes do lugar tivessem se defendido com galhardia, diante do grande número e violência indígena, bateram eles em retirada para as matas, sendo então a diminuta freguesia completamente saqueada e as casas incendiadas. Após a bandalheira, os índios se foram, deixando atrás de si a pequena povoação a ser reconstruída. A respeito desse acontecimento. O Jornal “O Sul Paulista”, de junho-julho de 1921, publicava a seguinte matéria:

“Entre os annos de 1825 e 1835, vieram ter no Valle do Rio Itariry, índios bravios, que alli commetiam toda sorte de depredações, atacando e roubando os destemidos aventureiros que para alli se dirigiam em procura de ouro ou tentavam fazer explorações agrícolas”.

Desse ataque, que devastou o pequeno povoado de Santo Antonio e outros sitios do Juquiá, Stokler fez referências minuciosas sobre a estratégia indígena utilizada, que surpreendeu os juquiaenses e não lhes deu condições eficazes de defesa. Esse embate quase vitimou primeiramente a família de Felipe Fernandes, que foi salva e avisada do ataque pelo alarido que fizeram as suas galinhas d’angola:

“Na manhãn daquelle dia do fevereiro os selvagens acharão por bem expulsar o povo do Juquiá. As pessoas dos sítios sabião que não tardaria a lucta porque muitas brigas e conflictos acontecerão no Juquiá asima e no São Lourenço porque as gentes querião habitar as terras boas do Tariry de onde os índios moravão e não lho consenttião. Com tudo elles os índios não descerão do Tariry e São Lourenço ao Juquiá. Vierão elles de rio abaixo da Pedra do Cavalo por caminho de terra na mata”. Stokler – 1835.

“De antes accultarão as embarcações na barra do São Lourenço e dahi vierão ter por terra volteando as picadas e grotas da serra e dando na Pedra do Cavalo despos do Juquiá, subindo a cometter das suas estripolias rio asima e fazendo primeiro soffrer o sitio do Fernandes e do seo pae Fernando Gomes que lhos roubarão conquanto antes as famílias delles forão seoccultar no mato porque lhe derão avizos as galinhas d’angola a quem os índios offenderão de pés e que ellas atravessarão o dicto rio voando e condemnando o ataque”. Stokler – 1835.

“Setinha conffiança o povo nas galinhas d’angola e mui gansos que seservião dar alarme e signal de invasão de estranhos. Da curva do rio abaixo elles os do Itariry gritavão phrases de vergonha forte e hião mui rápido que chegarão de surprhesa no outeiro. O povo fez frencte de tiro e por serem elles os índios em grande numero correo o povo despos para o mato e foi para esconder daquella gente não temmente a Deus e elles queimmarão as cazas primeiras do rio e despos subirão a collina da Capella que não lhe tocarão por estar trancada forte e não lhes foi consentido deitar fogo porque de novo se fizerão a cobertura de telhas de barro dias antes”. Stokler – 1835.

Embora jamais tenha sido mencionado na história de Iguape ou Juquiá, Martim dos Índios, contando na época sessenta anos de idade, mesmo chegando atrasado ao ataque, pois havia descido do Itariry, parando em todos os portos e avisando os sitiantes das intenções índias, tentou de todas as maneiras impedir que seus amigos cayuás continuassem com a sua missão de retaliação aos invasores. Stokler descreve o desespero de Martim em meio ao combate que desejava interromper, e o socorro prestado às vitimas, depois que os índios se retiram do morro da pequena Capela.

“Chegou do Tariry o Martim dos índios que antes avizou os povos da guerra dos amigos seos e veio elle na Freguezia para tentar parar a guerra e sobio elle mui tarde o morro da capella quando seos amigos tinhão ateado fogo a todo. Martim sefaz homem de sessenta annos e não conseguio fazer respeitar porquanto passarão seos amigos índios a empurral-o ao chão gritando alto e continuarão elles na covardia. Deitarão fogo nas cazas de pao e barro e palha, que antes procurarão por comida, roupas, armas e panelas”. Stokler – 1835.

“Matarão hum dos moradores que asima morava por se demorar este no fugir e que se fez despos o seo corpo queimmado dentro da caza. Despos elles descerão da Capella para roubar as cannoas e o barco de linha que antes pertencia a donna Catharina França que alli estava de poucco. Commeterão os actos e partirão os selvagens serindo e gritando sempre, alguns delles nas embarcações roubadas e outros delles pelos barrancos do rio. Despos de hidos os índios, o velho Martim dos índios que desanimado estava com seos amigos do Tariry chamou as gentes de volta e cuidou de ferimentos e das cazas com poucco fogo. Os índios subirão todos pello rio asima combatendo os sitiantes e matando delles alguns”. Stokler – 1835.

A 21 de fevereiro de 1835, passava por Juquiá uma expedição composta por 38 homens da Guarda Nacional. A tropa vinha de Iguape e era comandada pelo Capitão Agostinho Lourenço da Silva Doria. Esta tropa tinha a missão de se embrenhar nas matas do São Lourenço e Itariri para catequizar os indígenas. O Capitão Agostinho Doria era natural de Cuiabá. Sertanista, ele anteriormente havia andado as voltas com uma moradora de Juquiá. Era uma índia conhecida por Gertrudes Maria. Desse romance, em 1832, havia nascido um filho, a quem deram o nome de Tibiriçá, que, muitos anos depois, seria crismado com o nome de Luiz. Esse relato consta da obra “Iguape... Nossa História”, volume II, do historiador iguapense Roberto Fortes, e confirmado pelo “Annuário de Stokler”:

“Pedio o Juiz de Paz Fernando Gomes, feicto auctoridade de pouco, hum bom reforço do Iguape. Deo combate aos do Tariry o capitão Agostim Dória da Guarda Armada que por Juquiá andava a negociar sítios e terras e seservindo de caso com hu’a índia que lhe dera hum menino mestiço”. Stokler – 1835.

A força, ao subir o rio, ia se avolumando com os lavradores revoltados, de maneira que alguns destemidos juquiaenses foram e ela incorporados. Ao chegarem ao Vale do Itariri a expedição dividiu-se em duas, seguindo Lisbolio José com 16 homens para explorar a cabeceira de córregos e ribeirões. O Capitão Doria subiu pelo Guanhanhãn com 22 homens, até a Barra do Rio do Peixe e logo alcançou os indígenas, que aguardavam emboscados, travando com eles um terrível e violento combate. Os cayuás, protegidos pela mata, muito lhe peculiar, a todo o momento desferiam saraivadas de flechas sobre a força e os agricultores. A luta foi ferrenha, com os índios em maior número e abrigados pela mata, com ferocidade irracional, conseguindo debandar a força governamental, que se retirou do campo de batalha. Foram feridos Pedro José Paz, Ignácio Monteiro e Antonio José Dama, os dois primeiros, gravemente. O Capitão Doria transportou os feridos para a casa do alferes Bento Pupo, na Barra do Itariri, que lá ficaram para se restabelecer, mas onde, dias depois, faleceu o soldado lavrador Ignácio Monteiro.

“Elles subirão até o Tariry e forão batidos pelos índios, ficando acomettidos de doenças da mata quatro homens e o capitão e feridos no entrevero treis outros no violento combacte e delles hum vindo morrer no Tariry. Da parte dos índios se fizerão estragos grandes de feridos e não de mortos”. Stokler – 1835.

Como a expedição havia se dividido em duas, no dia 23, pretendendo o comandante seguir em socorro da escolta que ficara no mato, escreveu uma carta ao Juiz de Paz da Vila de Santo Antonio do Juquiá, o senhor Fernando José Gomes, pai de Felipe Fernandes, solicitando que viesse ver os soldados feridos em combate. Agostinho Doria solicitava, ainda, que lhe mandassem dois homens de Xiririca, que conheciam a língua dos índios e sabiam com eles tratar.

A história não deixou registros sobre o destino de Lisbolio José e seus 16 seguidores que haviam se separado do Capitão Dória e seus homens. Talvez tenham sido novamente incorporados à tropa ou, quem sabe, tivessem sido mortos pelos cayuás. Tanto pode ser verdade porque o Capitão Agostinho Doria não desistiu. Dias depois, acompanhado, desta feita, por vinte homens retornou às matas do Itariri. Depois de algumas incursões infrutíferas, no dia 05 de março encontrou com os índios. Ficaram ao longe, sem serem percebidos, ouvindo a gritaria no acampamento indígena e aprontando-se para atacá-los ao romper do dia seguinte. Mas, por volta da meia noite, irrompeu um grande temporal, que molhou e estragou os armamentos, pólvora e mantimentos. Completamente desarmada, a escolta deu meia volta e retornou para as canoas. Acontece que durante o temporal, o leito do rio subira incrivelmente rápido e levara as embarcações. A tropa foi obrigada a fazer uma canoa de jaraçatiá e jangadas de pau, atirando-se apressadamente, rio abaixo.

O comandante Doria comunicou o resultado da expedição ao Juiz de Paz Fernando José Gomes e este mandou que eles se recolhessem, pois haviam cumprido com os seus deveres. No dia 13 de março, o Juiz de Paz de Juquiá escreveu uma carta ao Presidente da Câmara de Iguape, para que a enviassem ao Presidente da Província de São Paulo, relatando o caso.

“Fez o Juiz de Paz de Juquiá voltarem as tropas e deo por encerrado as luctas pous os índios seretirarão despos e voltarão as tropas para Iguape c’o Dória ficando em caza de Lourenço Gomes por dous dias ainda”. Stokler – 1835.

Entretanto, poucos meses depois, em julho, os índios reapareceram no Itariri. O Juiz de Paz de Iguape, José Bonifácio de Andrade, pediu para que a Câmara fornecesse verbas para mais algumas libras de pólvora e chumbo, para que se pudesse derrotar os selvagens. O Presidente da Câmara, Manoel Duarte da Costa, promoveu o novo armamento e as tropas voltaram a dar combate ao gentio. Como os índios se dividissem em vários acampamentos, não durou muito e os cayuás foram finalmente derrotados e capturados, mas somente uma pequena parte deles. Levados para Iguape, os vencidos foram distribuídos entre as famílias do lugar, na condição de cativos.

Encerrando-se o último embate, daquele dia em diante, o governo achou por bem tentar apaziguá-los de outra maneira, infiltrando entre eles, índios mansos, intérpretes, vindos serra acima, para que civilizassem os aldeamentos do Rio Itariri e Rio do Peixe. Os moradores da Vila de Santo Antonio do Juquiá imaginaram que desta maneira poderiam, enfim, conseguir a paz tão desejada na região. Mas não foi fácil manter os índios capturados, que não se adaptavam à vida em sociedade. Oferecidos aos cidadãos de Iguape, estes, como nos conta o historiador Roberto Fortes, logo devolviam o “presente de grego” às autoridades. Stokler comenta o inglório destino dos orgulhosos índios capturados:

“Tempos despos voltarão os índios ao Tariry queimmando todo naquella região. Com o tempo despos os indígenas forão enfrenctados com a Guarda do Iguape com grande bulha e forão derrubados do Tariry e forão despos, hu’a parte daquelles bravios gentios, repartidos no Iguape como animaes, e outra parte maior continuando a habitar no Juquiá asima”. Stokler – 1835.

No ano de 1841, novamente o Juiz de Paz de Juquiá, ainda Fernando José Gomes, comunicou em ofício a Câmara de Iguape, lido em sessão de 12 de outubro, que os índios teriam novamente surgido no Itariri. A Câmara, então, autorizou Fernando José Gomes a destinar terrenos, para o estabelecimento dos indígenas. O lugar escolhido foi no Rio do Peixe, onde sempre estiveram, sendo os silvícolas legalmente ali instalados.

“Voltarão os do Tariry no anno de 41 no conflicto e queimmarão as cazas do rio asima e abaixo para que dessem de volta as terras que erão suas de antes e que forão novamente accupadas pelo povo. Assim foe feito por Iguape, com ajuda de Martim, hum accordo de medição das terras dos índios, quedando elles do Tariry para o sossego no Rio do Peixe de sima”. Stokler – 1841.

Mas a violência entre as partes continuou por muitos anos ainda, fazendo com que as famílias morassem agrupadas ou o mais perto possível uma das outras. O temor era tão grande que atingia até aqueles que nada tinham a dever. Lavradores ou aventureiros, que utilizavam os cursos dos rios, traziam acompanhantes indígenas mateiros, de outras tribos já pacificadas, ou mestiços, a bordo de suas canoas. Descobertos os intrusos detestados, no calor das emoções, eram identificados como espiões. A embarcação era barrada pelos moradores e, daí para frente, convencer a população ribeirinha da inocência dos mateiros, era obra para muito tempo. Segundo Stokler, alguns índios mateiros forasteiros, que serviam como guias a exploradores, foram mortos pelos juquiaenses:

“Estavão os sitiantes a temer o surgimento de qualquer hum dos índios que subissem o Juquiá ou delle descessem. Por duas vezes vierão ter no Juquiá pessoas que desbravavão terras asima e sefazião acompanhar de hum ou dous delles como bons mateiros e que nada tinhão com os do Tariry. Carregados de temor e raiva nelles incontidas os moradores paravão as embarcações e dellas tomavão os pobres índios debaixo de agressões que levavão a morte delles. As auctoridades ameaçarão prender a todos que fizessem estripulias a elles e o facto deo assim por encerrado com as mortes dos que vinhão”. Stokler – 1841.

As refregas entre índios e brancos, em escaramuças esparsas, à beira rio ou no interior da floresta, ainda perdurou por muitos anos, até 1843, quando então, mais uma vez, o Juiz Municipal de Iguape Francisco Carneiro da Silva Braga, em 12 de setembro daquele ano, comunicou ao Presidente da Província de São Paulo, que os selvagens do Distrito da Capela de Juquiá deitaram fogo às casas dos moradores daquele lugar. Foi criado um aldeamento entre os rios Itariri, do Peixe, Ribeirão da Tyaia, e vertentes as serra; possuindo aproximadamente três quartos de légua de comprimento e meia légua de largura. Para evitar futuras lutas, também foram nomeados interpretes dos mesmos, sendo um dos primeiros a assumirem o cargo o lavrador João Romualdo Lorena, que ali foi residir em companhia de sua esposa.

“Novamente voltarão os índios neste anno de 43 queimmando o povoado do Juquiá e dos sítios correndo com o povo do rio para o mato daquelle logar. Despos dos tempos ficarão sossegados na aldea em alliança c’o comando do Lorena”. Stokler – 1843.

Obs: Relatos da Obras e histórias de Juquiá.Historiador Hermann Volpert.Um historiador que procura a anos encontrando relatos relacionada a nossa história que ao contrário do que muita gente possa imaginar é fantástica.

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