Leia na integra o relato da viagem até a passagem por Juquiá e tenha uma noção como era a vida por aqui nessa época.
A´12 de junho do corrente anno partia desta capital a turma encarregada do levantamento hydrogrphico da bacia do rio Juquiá, seguindo via Santos, e ahi tomando o vapor Vitoria, do Lloyd Brasileiro, que a transportou a Iguape, de onde desembarcou no dia 13, às 2 horas da tarde.
Este dia manteve o céu encoberto e a 14 começou caindo uma chuva miuda e impertinente. O vapor Bento Martins, requisitado para transportar a turma até a barra do Juquiá e a da ribeira até a Xiririca, não pode fazer a viagem por estar concertando o leme.
Nos dias 15 e 17 continuou o mau tempo, reinando vento sul; entretanto, fizemos alguns preparativos de viagem, tendo esta marcada definitivamente para o dia 17, dia e hora a que effectivamente teve logar. Da cidade a bocca do vallo grande gastou o vapor 10 minutos e a percorrel-o 15, ao cabo dos quaes se encontra o porto da Ribeira, estuario ladoso e vasto. A beira do rio duas ruas irregulares prolongam-se, com tres caminhos para a estrada que vae para Iguape. Tanto a capella como as casas são velhas, algumas em ruínas, destacando-se, porém, um engenho de beneficiar arroz.
Proseguindo a viagem, anoiteceu já quando o vapor passavano Sapocoitaba, onde está a barra do furado do Enfadonho, pela esquerda; e foi pernoitar em frente á barra do rio Jacupiranga. Durante a noite foi agradavel a temperatura; o céu escuro.
A 18, pouco depois da 6 horas da manhã, o Bento Martins levantou ferro em direção á barra do Juquiá, verificando ter o primeiro a largura de 214 metros e o segundo de 78 metros.
No dia 20, apezar de achar-se o tempo bem nevoado, partimos da barra do Juquiá ás 8 1/2 da manhã; e já por ser o primeiro dia de serviço, já por ter necessidade de instruir o pessoal, percorremos apenas 6 K. 400, embora o rio permitisse visadas de 300 a 400 metros. Fizemos o pouso na fóz do rio Quilombo, onde tirámos sa secções transversaes deste rio e do Juquiá, encontrando neste a largura de 72 metros e naquelle a de 52. As principais aguas que hoje encontrámos, excptuando a do Quilombo, são os ribeirões do motta, do Barranco Alto e do Mimoso, este affluindo da direita e aquelles pela esquerda.
Os dois ultimos atravessam as lagôas dos mesmos nomes e que são deixas do rio Juquiá, isto é, leito antigo deste rio, modificado pelo povo para encurtar suas viagens. Ha ainda, no percurso feito hoje neste rio, uma outra lagôa, pela esquerda, a do Valerio, mas te tal modo se acha obstruida pelo capim, que nem a vimos e só um morador do local a poderia apontar. Da barra do Juquiá á barra do Quilombo, o rio corre no rumo N, entre varzeas alagadas e que frequentemente são inundadas pelas aguas do Ribeira e do Juquiá; e, effectivamente, verificámos que o povo aqui soffre com as enchentes dos rios, havendo grandes inundações periodicas. A de maio do anno passado subiu 3m 70; ha ainda lembrança de uma outra, occorrida ha uns 15 annos, e que levantou as aguas a 5m 56. As casas são verdadeiras habitações lacustres, construida a 4 metros do solo.
No dia 21, depois de termos almoçado, partimos ás 10 horas da manhã, percorrendo neste dia 9k 200, no rumo geral de E, mas com peguena inclinação para N; e neste percurso affluem: ao Juquiá os ribeirões do Alexandre, pela direita, e o de S. Domingos, pela esquerda, bem como, pela direita, o rio Ipiranga, que antes era affluente do Quilombo, mas que o povo para evitar uma grande volta, fez communicar directamente com o Juquiá. As margens deste rio são bordadas por fitas de capoeira, cuja a largura media é de 3 metros; para dentro, são extensas varzeas alagadas, brejos intransítaveis e inaproveitaveis.
A profundidade média do rio, nas suas margens, é de 3 metros; quanto á do canal, desconheço-a, mas vimos ser superior a 7 metros. Os ribeirões Alexandre e S. Domingos, já descriptos, são navegaveis, e proximo ao primeiro delles encontra-se muitos moradores.
A 22, ás 10 horas da manhã, partimos e ás 2 horas da tarde, detidos por forte garôa, fizemos pouso no sitío do Barrão, tendo percorrido 6k 000, na direcção geral NE, sem que afflua agua alguma e sendo o aspecto geral das margens identico ao do dia anterior, apenas apparecendo aqui e alli algumas insignificante plantação de canna, de que os moradores se servem para adoçar o café. Antes de chegar ao Barrão, ha uma ilha de arêa, com uns 50 metros de comprimento, a qual termina de fronte de uma volta do Juquiá ahi encurtada por um furado que reduziu de 90% o trajecto. Devido a este furado, a deixa do Juquiá formou uma lagôa, hoje conhecida pelo nome de Lagôa Nova; seguem-se-lhe a Lagôa do Barrão e a Lagôa da Boa Vista, parecendo ser esta a mais extensa e vae terminar proximo da encosta da Serra da Boa Vista, cordilheira comprida, porém pouco elevada. Esta lagôa encontra-se todas na margem direita do Juquiá e communicam entre si nas épocas de enchente.Não obstante trazermos barracas e os pousos não serem bons, não nos foi possivel armar aquellas, attentas as condições do terreno.
A 23, às 10 horas da manhã, apezar da garôa que caia, partimos do pouso; mas à 1 hora da tarde, tendo percorrido apenas 3k.000, na direção geral de L, fomos forçados a fazer pouso na barra do ribeirão fundo, porque a garôa se transformou em chuva. As margens do Juquiá continuam a ser bordadas pelas mesmas fitas de capoeira, porém mais viçosas. Neste trecho o rio é entremiado de pequenas praias e suas voltas são mais sucessivas, diminuindo o alcance das visadas. Também continuam os terrenos alagados e as lagôas.
Choveu durante toda a noite de 23 para 24 e também todo esse dia, pelo que não podemos proseguir. A`noite o céu appareceu estrelado.
A 25, às 9 1/2 da manhã, partimos do pouso. Começa o rio margeando a serra da Boa vista e continuam os brejos, mas já com intermittenciais. Percorremos neste dia 11k.000, na direcção de E para O, e neste trecho afflue apenas um ribeirão, o do Descalvado. Fizemos pouso no sítio das Onças, onde estava um homem mordido por cobra jararáca,mas a quem não vimos, por ser crença entre o povo que o enfermo visto por um estranho peiora!
A 26, bem cedo ainda partimos e pudemos chegar ás 5 horas da tarde, com um percurso de 16 k.000, á freguezia de Santo Antonio do Juquiá, no kil, 52,182.A viagem deste dia foi interessante, já pelas successivas e violenta voltas, que muito diminuem o alcance das visadas, já porque as serras se approximam tanto do rio, que alguns morros vêm morrer nelle, apparecendo nos barrancos diversos blocos de graníticos. Os fogões são mais proximos, e entre elles ha soffriveis casas de moradia, todas contruidas segundo o simples e desgracioso estylo primitivo.
O rumo geral do rio, no percurso deste dia, é de E para O; e o Juquiá conserva, desde sua barra no Ribeira até o povoação de Santo Antonio, a mesma largura e profundidade.
Passámos na frquezia o dia 27, ocupando-nos em serviços diversos, taes como visadas para as serras proximas e croquis das mesmas, levantamento da secção transversal do rio em frente ao porto e renovação de mantimentos, para chegar até à Prainha. O Juquiá tem aqui a largura de 112 metros e a profundidade maxima de 3 1/2, quando todo o canal daqui para baixo é bem mais fundo e dizem-nos daqui para cima também.
A povoação de Santo Antonio nada offerece de notavel, a não ser a absoluta falta de ruas ou largos; nas noites escuras os moradores não podem communicar-se entre si, sem se munirem de lanternas. Ha , sómente na povoação e circumvisinhanças, umas 100 creanças de ambos os sexos; mas nenhuma das escolas creadas se achava provida. Existem apenas 8 casas, das quaes 3 lojas de negócio; tem tabém a capella, que é terrea, velha e desgraciosa, desguarnecida de ornatos e alfaias.
A 28, dia lindissímo, partimos às 9 horas da manhã.....
Daqui em diante a expedição seguiu rio acima em direção ao rio São Lorenço para continuar o mapeamento e os trabalhos de medições.
Trabalho hidrográfico execultado por João P. Cardoso (chefe da comisão).
Secretário da agricultura, Dr. Carlos J. Botelho.
Histórico pesquizado no Museu Pedro de Castro Laragnoit em Miracatu SP.
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